Projeto de publicação de textos enviados para nós. Aqui vai o primeiro:
(Originalmente escrita em 01/01/2016)
Parecia uma peregrinação. Uma romaria. Para alguns, talvez até mesmo uma cruzada. Um sem-número dos mais variados tipos de pessoas seguia em fila, no escuro, como se tal movimentação fosse uma espécie de sina. Apesar da falta de iluminação, todos ali seguiam o mesmo trajeto que a humanidade faz desde que se estruturou: o caminho do mar. Logo chega a areia. Ainda úmida pela maré do fim da tarde, ainda quente pelo calor que a umidade retém. Apesar da escuridão, é possível distinguir pequenos grupos de pessoas. A maioria é de famílias e amigos próximos, mas há sempre o dos amigos, dos conhecidos e até os dos desconhecidos. Um pouco de tudo, em detrimento de todas as diferenças. As semelhanças, por mais triviais que sejam, são o que chamam a atenção: as garrafas de bebidas — baratas ou caras, nacionais ou importadas: a universalidade do ébrio é inquestionável -, velas acesas e orações sendo murmuradas. Um pouco de aflição mas, principalmente, sorrisos. Dos mais diferentes tipos e intensidades, mas todos carregados do mesmo sentimento. O fim do ano se aproxima. Estamos nos últimos momentos de 2015. Ao longo da praia já são visíveis explosões dos fogos de artifício. O tempo que o som leva pra chegar de lá até o presente local é curto, mas já é o suficiente para fazer com que os mais atentos comecem o estouro de suas bebidas gaseificadas e suas marchas em direção ao infinito onde o céu encontra o mar. O ponto onde os deuses se encontram. Onde há paz. Onde nada chega, mas tudo almeja. O estouro dos fogos faz-se generalizado. Já é ano novo em toda a praia, e não apenas naquele ponto longínqüo. Não era uma corrida, tampouco um só evento, mas foi dada a largada. Independentemente das querelas, angústias e sofrimentos, a costa enche-se de abraços, lágrimas de felicidade, beijos e indistintas declarações de amor. O céu, apesar de claro e aberto, está sem lua, dando à escuridão o direito de reinar. Mas nem mesmo o horizonte permaneceu incólume à contínua linha de frente composta de branco que adentra o atlântico. Uma linha que avança em cada ponto a seu próprio modo, mas continuamente, até onde a vista alcança. Todos olham fixamente para frente. Para o passado. Para o futuro. Para o mais distante do mar. Alguns pulam ondas, alguns contemplam o momento. Alguns simplesmente entram sem muita cerimônia. Mas a constante é o respeito, por mais que dissimulado. É quando colocamos de lado todas as — literalmente — histórias de pescador acerca da temerosidade que o mar nos desperta. Neste dia acolhemos apenas as que envolvem a magnanimidade e a beleza do “azul” em “planeta azul”. O mar é imponente. Ele castiga. Destrói. Mas também afaga. Naufraga embarcações mas também lava almas. Basta saber ter respeito. E, neste dia, almas foram lavadas. Dado fim às formalidades ritualísticas, resta a muda contemplação de tudo o que acontece simultaneamente. Seja a surpresa de um céu limpo, seja o imponente rugido do mar, o sentimento de paz reinante ou o show de fogos. Show de fogos, este, a única fonte de iluminação. Entre zunidos ligeiros, ribombos grosseiros e explosões amorfas, os mais diversos brilhos, cores e sentimentos iluminam por alguns segundos os rostos aliviados e tranqüilos da platéia de branco. E, na intermitência de luzes, sons e olhares, um mudo, silencioso e sincero sorriso resplandece no rosto dos dois, num inefável e imprevisível encontro dos olhos. Um igualmente mudo sentimento do amor ressoa em suas mentes enquanto as faíscas no céu brilham na profundidade de seus olhos. No obscuro de seus corações, ao menos hoje, há um brilho que ilumina todas as cavidades cardíacas, até mesmo as há tempos abandonadas.
Por: Gabriel Teixeira https://medium.com/@gabrieltxg
Está de parabéns!!
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Lindo texto.
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Adorei o texto!!
Da uma olhadinha no nosso blog https://paranoiadeumaruivaemeia.wordpress.com/
Espero que goste, beijos ❤
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